quarta-feira, 29 de abril de 2009

La ciudad y los agujeros negros

Caminar al azar é a expressao em castelhano para andar sem rumo, a esmo. Significa o mesmo, mas diz mais que sua equivalente em portugues. Nao é apenas o fato de andar sem direcao, mas também e principalmente sem um propósito claro, sem saber o que pode acontecer. Dessa forma caminhei sozinho por uma cidade desconhecida de um país desconhecido. Nao sabia o que esperar e até o fim do dia nao sabia o que dizer. Já de noite, reparei que as estrelas têm uma cor diferente. Sao azuladas, quase todas.

As coisas ao redor comecavam a fazer algum sentido. Em outra caminhada, sozinho, percebi-me em meio a várias pessoas que também estavam sozinhas. Cada um de nós, um ao lado do outro, com sua solidao plácida e contemplativa. Senti-me menos sozinho. Agora, eu tinha a companhia da solidao dos outros e isso me reconfortou. Súbito, percebi minhas primeiras impressoes.

Para entender a cidade, converti-me em um buraco negro. Nada saia de mim, tudo que eu estava habilitado a fazer era absorver a energia ao meu redor. Pouco a pouco, as sensacoes comecaram a refluir. Pude perceber que o dia também tem uma cor diferente, apesar de ser a mesma.

sábado, 25 de abril de 2009

Sugestão de leitura




Título: O encontro marcado
Autor: Fernando Sabino
Gênero: Livros que arranham a alma
Advertência: Não deve ser lido durante relacionamentos estáveis. Pode provocar surtos de angústia. Indicado para homens com barba na cara.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

São Salvador

"Hemos guardado un silencio bastante parecido a la estupidez."
Proclamação da Junta Tuitiva de los Derechos del Pueblo, 1809, Bolívia

Vi praças e praças. As que mais ficam na minha cabeça são as que vi na Bolívia. Todas limpas, convidativas, boas para não se fazer nada em meio a uma viagem cheia de atrações. Lembro que era sempre cedo demais para deixá-las. Havia um clima de paz que pairava sobre elas. As cidades reservavam-nas da bagunça, do urbanismo que a quase tudo enfeia. Não percebi barreiras. Vi gentes de paletó, estudantes, crianças, gentes pobres. Havia engraxates que usavam umas máscaras esquisitas e sorveiteiros que vendiam un helado por 1 peso boliviano, mas não havia a profusão de vendedores ambulantes que ocupam as nossas praças por aqui. As praças pareciam tacitamente reservadas para o encontro público. Para o abraço entre velhos amigos e para monumentos à libertação colonial. As praças tinham um significado. A mais bonita que vi foi a Plaza Pedro D. Murillo, ou, como gosto de chamar, "Las puertas de Evo." É a praça mais importante de La Paz, onde fica sediado o palácio presidencial e o parlamento, um ao lado do outro. As gentes estavam lá, vivendo, às portas de Evo. Um pôr-do-sol inesquecível baixou sobre a praça e, com ele, o sentimento de que o tempo se move sempre contra nós.

Pensei, ao sentir tudo isso, que aquelas praças eram um sinal do que havia sido. Imagino que, no Brasil, as praças das cidades importantes já foram assim. Mas a modernidade e o urbanismo de interesses transformaram-nas no que temos hoje. Entendi a Bolívia, nesse aspecto, como um retrato do passado. Como algo que ainda não foi deturpado. Pois só assim consigo explicar por que o país mais pobre da América Latina dispõe de lugares públicos como esses em suas grandes cidades.

Hoje, vi a tristeza do nosso tempo no chafariz desligado que se impõe na praça São Salvador, um dos lugares mais agradáveis da Zona Sul do Rio. Vi o mesmo retrato do passado posto no presente tão desumano em que vivemos. A tristeza não é pela praça, pelo contrário, é pelo que está em volta dela. Um mundo como esse dificilmente permitirá que a extremamente aprazível praça São Salvador sobreviva com a autenticidade pacata que ainda conserva. Um mundo como o nosso não nos convida às praças, ao encontro, ao senhor que come uvas enquanto crianças pulam na cama elástica. Claro, não é a praça que está fora de lugar, mas o mundo que a cerca. A tristeza é um sinal de que precisamos de mais motivos para sorrir.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Soy Cuba

"Las taras del pasado se transladan al presente en la conciencia individual y hay que hacer un trabajo continuo para erradicarlas. (...) En momento de peligro extremo es fácil potenciar los estímulos morales; para mantener su vigencia, es necesario el desarollo de una conciencia en la que los valores adquieran categorías nuevas. La sociedad en su cojunto debe convertirse en una gigantesca escuela."
Che

Tenho muito a aprender sobre Cuba. Tenho inclusive que conhecer Cuba com meus próprios olhos e sentimentos vivos. Mas, desde já, algo é possível dizer sobre a pequena grande Ilha. Não houve no Ocidente nada que se assemelhasse à Revolução Cubana. Não falo do destemor e heroísmo que conduziu uns poucos barbudos ao controle de Sierra Maestra e, depois, de todo o país. O que impressiona é perceber que todos os sonhos que hoje chamamos utopia foram, em algum momento, realizados concretamente em um pedaço do mundo, em um trecho da História. Cuba não pode ser confundida com o socialismo real do Leste Europeu. Mesmo os soviéticos que visitaram a Cuba revolucionária em seus primeiros anos se depararam com algo novo, surpreendente aos seus olhos. A revolução dos trópicos era mais humana. Não havia o desejo expansionista típico dos outros países capitalistas e do bloco soviético. Não havia o desejo nem a chancela social ao imperialismo, à diferenciação de povos e indivíduos, antes o contrário. Não havia em Cuba, talvez por carência material, do lógica produtivista e industrialista que caracterizaram outros regimes ditos comunistas. Não havia exploração de indivíduos sobre os outros. Havia, de fato, uma sociedade sem classes em construção.

Cuba transformou-se numa sociedade em que todos faziam o que faziam não pelo intermédio único de seus interesses, não pelas exigências do mercado. A sociabilidade era direta, imediata. Intelectuais cortaram cana, gente de todo o país participou das campanhas de alfabetização. A consciência de que todos precisavam trabalhar por todos era tácita. Pairava no ar o espírito de um novo homem e de uma nova sociedade que estavam por ser construídos. A verdade foi pronunciada de forma clara e o povo mudou sua história. Provou que não há apenas um caminho, que a história não tem fim. Nem tudo saiu como se esperava, mas a consciência cubana é a maior prova de que a revolução venceu. Ao mesmo tempo, a derrota da revolução pelo mundo e pela História apenas confirma que ela foi vitoriosa. Se o socialismo cubano não pôde ou não poderá resistir ao mundo capitalista, isso apenas atesta que a ordem capitalista está errada e que todos devem trabalhar por um novo mundo, onde a humanidade será definitivamente vitoriosa. Aos que contestam a revolução, respondo que, não fosse ela, Cuba seria hoje mais uma ilha miserável e colonizada da América Central, como o Haiti ou a República Dominicana, seus vizinhos.

O socialismo será uma nova ordem na qual massas inteiras da população não serão supérfluas, como são hoje na América Latina e na África, por exemplo. Uma ordem em que a pobreza e a miséria não serão mero apêndice dos caprichos burgueses, para o qual o máximo permitido é um tanto de caridade e altruísmo baratos.

A realidade está em cada ponto de ônibus, em cada sinal de trânsito, em cada canal de televisão. Se não a vemos, não significa que ela não exista, mas que precisamos mudar nossos óculos. Así se pasó en Cuba. Espero que se pase en todo el mundo.

Sobre o título

Não há o que dizer sobre o título desta página. A não ser o fato de que se trata aqui de conversas diferentes daquelas que se pode ter com os outros. Aqui estão outras conversas, daquelas que só posso ter comigo mesmo.