Sempre tive uma curiosidade especial pelos Largos. Em primeiro lugar, porque são elementos urbanos que não existem em Fortaleza, pelo menos não com esse nome. Quando cheguei ao Rio, olhava para um Largo e não conseguia captar sua função precisa no espaço, algo que fosse próprio de um Largo e o distinguisse, por exemplo, de uma praça. Cheguei a pensar que fosse apenas uma questão de arcaísmo lingüístico: algo que antes recebia o nome de Largo e depois passou a ser praça, mas continuou sendo chamado tradicionalmente pela forma antiga. Seria o caso do Largo do Boticário, por exemplo. Mas, ainda nesse campo, notei que enquanto as praças normalmente recebem nomes diretamente (General Osório, São Salvador, Afonso Pena), o Largo é sempre de alguma coisa ou de alguém: das Neves, da Segunda-feira, da Lapa.
Depois de um tempo fui percebendo que havia algo no Largo que não havia na praça. Pense-se, por exemplo, no Largo dos Guimarães ou no Largo dos Leões. Definitivamente, não são praças. O Largo é tipicamente um espaço largo, comparado ao que o cerca. Nesse sentido, entendo o Largo como um espaço que ficou, algo que não foi propriamente planejado (ainda que possa ter sido). Um espaço largo que sobrou depois que tudo foi construído ao seu redor e que posteriormente foi urbanizado e batizado. Servia como uma referência espacial antes e continuou servindo depois. Mas o Largo de São Francisco também é um Largo, e bem largo. Por isso, um Largo é largo, mas é relativo. Nesse sentido, acho que o Largo é um pouco também como um estado de espírito: cada Largo tem o seu e depende de onde está. Assim, defino o Largo como um espaço que ficou, dotado de um determinado estado de espírito.
Curiosamente, o primeiro lugar em que morei no Rio fica ao lado de um Largo que parece praça, o do Machado. Este, por sua vez, fica perto de uma praça que parece Largo, a José de Alencar. E os dois, Largo e praça, levam nomes de escritores. Talvez eles soubessem explicar melhor que eu o que é um Largo e o que é uma praça. Infelizmente, dado que já se foram, terei de me contentar com minhas próprias especulações metafísicas sobre o assunto. O fato é que lá morei com um cara que tempos depois me escreveu uma música chamada Canção dos Largos. Ela fala de Largos, de um espaço vazio que ficou e de um certo estado de espírito. Ele fez por mim algo lindo que eu não poderia fazer. Coisa de amigo, de irmão.
Um comentário:
Filho e Pedrinho,
Nos encontros da vida é sábio saber garimpar e cultivar amigos, amigos irmãos, nascidos em largos diversos, por sutis e felizes acasos lançados caminhantes em largos comuns. Valorizem essa caminhada. Vocês me emocionam.
Beijo do pai e tio.
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